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A afetividade na inclusão escolar

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A afetividade influencia no modo com que as pessoas percebem o mundo e na forma com que interagem dentro dele. Todos os acontecimentos da vida de uma pessoa trazem recordações e experiências para toda a sua história. Dessa forma, o afeto determina o modo com que um indivíduo se desenvolverá. Também determina a autoestima das pessoas desde a infância, pois quando uma criança recebe afeto das pessoas com quem convive, seja em casa seja na escola, consegue crescer e desenvolver-se com segurança e determinação.

Até pouco tempo, a escola se preocupava somente com as áreas acadêmicas, e sua principal função era ensinar e avaliar com objetivo de selecionar alunos. Os alunos com Necessidades Educativas Especiais eram levados para escolas especializadas que atendiam sua especificidade ou eram classificados como fracassados dentro do sistema escolar. Contudo, ‚nas últimas décadas, por motivos sociais e educativos, desenvolveu-se uma verdadeira preocupação em atender aos que tem necessidades educativas especiais e integrá-los de maneira efetiva nas salas de aula (LÓPEZ, 2004, p. 113).

Os estados emocionais e sentimentais formam a afetividade, um dos principais aspectos do comportamento humano. Por sentimento, entende-se o estado afetivo brando, suave, de prazer, desprazer ou indiferença. Quanto às emoções, são reações marcadas por um grau muito forte de prazer ou desprazer e por uma reação motora intensa. Embora tenham os nomes dos sentimentos (surpresa, alegria, tristeza, ciúmes, raiva, nojo etc.), as emoções são experiências mais simples, estão ligadas às necessidades naturais.

Nesse sentido, Mahoney e Almeida (2007, p. 17) afirmam que ‚a afetividade se refere à capacidade, à disposição do ser humano ser afetado pelo mundo externo e interno por meio de sensações ligadas a tonalidades agradáveis ou desagradáveis. A afetividade é o conjunto de fenômenos psíquicos que são experimentados e vivenciados na forma de emoções e de sentimentos.

Pensar e sentir são ações indissociáveis. Para superar as dicotomias entre razão e emoção e entre as dimensões cognitiva e afetiva do funcionamento psíquico humano, podem-se abordar diferentes concepções.

Nessa perspectiva, Wallon (2007, p. 121) afirma que as emoções consistem essencialmente em sistemas de atitudes que, para cada uma, corresponde a certo tipo de situação. Atitude e situação correspondente se implicam mutuamente, constituindo uma maneira global de reagir que é de tipo arcaico e frequente na criança.

À medida que a criança se desenvolve por meio das interações com o meio em que vive, ela passa por etapas denominadas de domínios funcionais, que correspondem à afetividade, ao ato motor, ao conhecimento e à pessoa. A interação do meio com esses domínios funcionais implicará em trocas e adaptações que constituirão o indivíduo.

Wallon (apud MAHONEY; ALMEIDA, 2000) salienta, ainda, que afetividade e cognição se alternam na dominância, porém, não são funções exteriores uma à outra. Uma incorpora as conquistas da outra.

Nessa linha de pensamento, Piaget (apud LAJONQUIÈRE, 1998, p. 128) afirma que,

em um primeiro sentido, pode se dizer que a afetividade intervém nas operações da inteligência; que ela estimula ou perturba; que ela é causa de acelerações ou de atrasos no desenvolvimento intelectual; mas que ela não será capaz de modificar as estruturas da inteligência. Em um segundo sentido, pode-se dizer, ao contrário, que a afetividade intervém nas estruturas da inteligência; que ela é a fonte de conhecimentos e de operações cognitivas originais.

Portanto, durante toda a vida de um indivíduo, existe uma equivalência entre as construções afetivas e cognitivas. O aluno precisa ser estimulado, não somente cognitivamente, para aprender de forma significativa, mas também afetivamente. Segundo Piaget‚ o aspecto afetivo em si não pode modificar as estruturas cognitivas, embora ele possa influenciar na mudança das mesmas, não existem estados afetivos sem elementos cognitivos, assim como não existem comportamentos puramente cognitivos (apud LA TAILLE, 1992, p. 6). Nessa perspectiva, o papel da afetividade é funcional na inteligência. Ela é a fonte de energia que a cognição necessita para seu funcionamento. De acordo com o autor citado, o principal aspecto determinante da evolução do homem são as fases do desenvolvimento biológico, o que não impede que a afetividade acelere ou atrase esse desenvolvimento. O processo de desenvolvimento socioafetivo da criança ocorre ao longo da infância por meio de sua interação com a família. A sociedade e a escola podem ou não proporcionar vivencias afetivas que lhe darão a estrutura essencial para uma vida melhor e mais saudável, contribuindo para o seu desenvolvimento e sua aprendizagem. Nesse sentido, López (2004) enfatiza que o essencial é que as crianças tenham uma boa história de apego e uma capacidade de se relacionar socialmente.

Mesmo que isso vá́ além das possibilidades da escola, essa deve contribuir para a segurança emocional da criança, promover o compromisso dos pais com a educação dos filhos e favorecer as relações com os iguais. Para o autor, existe um fator afetivo, extremamente importante, que pode fortalecer-se não apenas pela educação incidental, mas também pela educação formal. As emoções influenciam e diversificam o comportamento. Portanto, quando as palavras são ditas com sentimentos, agem sobre o indivíduo de forma diferente de quando isso não acontece.

Wallon, um dos principais teóricos do desenvolvimento humano, atribui, em sua teoria, grande importância à emoção e à afetividade, elaborando conceitos a partir do ato motor, da afetividade e da inteligência. As definições a respeito da afetividade não impedem de afirmar que todos concordam que tal condução represente a síntese dos sentimentos, interesses, desejos, tendências, valores e emoções dos indivíduos, por isso, trata-se de um elemento de suma importância na vida de cada um. Do mesmo modo, todos os teóricos partem da ideia de que a afetividade é diretamente influenciada pelo meio social ao qual pertencemos, o que torna os pais os primeiros contribuintes do desenvolvimento afetivo da criança.

 

 

De acordo com Coll (2004), durante a primeira metade do século XX, o conceito de deficiência incluía as características de inatismo. As pessoas eram consideradas deficientes por causas fundamentalmente orgânicas. Tal conceito fez com que começassem a desenvolver trabalhos para diagnosticar e resumir em diferentes categorias os transtornos detectados.

Ao longo dos anos, as categorias foram se modificando, mas continuava a prevalecer o conceito de que a deficiência era um problema inerente à criança, por isso havia poucas possibilidades de intervenção educativa. Essa visão existente durante as primeiras décadas trouxe consigo consequências significativas. Uma delas era a necessidade de um diagnóstico preciso do transtorno. Esse diagnóstico era feito por testes de inteligência, que ajudavam a delimitar os diferentes níveis de normalidade e de deficiência de cada pessoa, permitindo saber em qual escola o aluno poderia estudar.

A partir da década de 1960, produz-se um movimento bastante forte, impulsionado por movimentos sociais diversos, provocando grandes transformações no campo da educação especial. Começou a ser empregado o conceito de necessidades educativas especiais.

Discorrendo sobre o tema, Marchesi (2004, p. 19) preconizou que a escolha do termo “necessidades educativas especiais” reflete o fato de que os alunos com deficiência ou com dificuldades significativas de aprendizagem podem apresentar necessidades educativas de gravidades distintas em diferentes momentos. Existe, como consequência, um conjunto de alunos que manifestam necessidades educativas especiais em algum momento ao longo de sua escolarização.

Entende-se, na citação feita pelo autor, que cada aluno deve ser acolhido de acordo com suas necessidades. Em certos casos, tais necessidades são mais permanentes e requerem recursos especiais para que a resposta educativa tenha êxito. Em outros, os problemas são menos graves e devem receber ajuda específica em classes de ensino comum.

No Brasil, com a Declaração de Salamanca3 (UNESCO, 1994), adotou-se uma interessante concepção de Educação Especial, ao utilizar o termo, pessoa com necessidades educacionais especiais estendendo-o a todas as crianças ou jovens que têm necessidades decorrentes de suas características de aprendizagem.

O princípio é que as escolas devem acolher todas as crianças, incluindo crianças com deficiências, superdotadas, de rua, trabalhadoras, de populações distantes, nômades, pertencentes a minorias linguísticas étnicas ou culturais, de outros grupos desfavorecidos ou marginalizados. Para isso, sugere que se desenvolva uma pedagogia centrada na relação com a criança, capaz de educar com sucesso a todos, atendendo às necessidades de cada um, considerando as diferenças existentes entre elas.

 

A inclusão exige mudança de atitude da escola que deve perceber que todos os alunos são diferentes entre si e preparar-se para dar atenção pedagógica de acordo com as necessidades educacionais manifestadas. Trata-se de mudança de enfoque no conceito de educação, pois não só a família e o aluno com deficiência ou com condutas típicas se esforçam para adaptar-se à escola, mas essa, também, se transforma de modo a facilitar e tornar possível o ensino para todos.

Segundo Mantoan (2008), ainda há́ muitas barreiras a serem ultrapassadas para que a educação inclusiva seja, de fato e de direito, uma conquista da educação brasileira. A inclusão escolar é um caminho que todos precisam aprender a trilhar. Além da mudança cultural, os serviços de apoio, os recursos especializados, a eliminação de barreiras físicas, o domínio técnico dos professores e a atitude pessoal de acolhimento cotidianamente devem transformar as escolas num ambiente positivo e solidário, necessário à aprendizagem de todos.

A garantia de uma educação inclusiva para todos envolve um redimensionamento da escola no que consiste não somente na aceitação, mas também na valorização das diferenças. Portanto, a escola deve contribuir não só para a aquisição de conhecimentos, mas também para a construção do caráter e da personalidade, além de proporcionar o vínculo afetivo entre os alunos.

 

A formação do professor é primordial para que o processo de inclusão ocorra, pois ele precisa estar preparado para situações diversas no contexto escolar. Além de ser necessário um conhecimento na área de educação especial, é preciso que ele tenha um excelente relacionamento interpessoal com todos os alunos, baseado no diálogo, no respeito e no afeto.

 

Perceber o sujeito como um ser intelectual e afetivo, que pensa e sente, simultaneamente, e reconhecer a afetividade como parte integrante do processo de construção do conhecimento implica um outro olhar sobre a prática pedagógica, não restringindo o processo ensino-aprendizagem. O ensino individualizado para os alunos que apresentam problemas de aprendizagem não é uma prática inclusiva. Esse método continua separando e discriminando os alunos dentro das salas de aula.

Sendo assim, Mantoan (2003, p. 67) afirma que a inclusão não prevê̂ a utilização de práticas de ensino escolar específicas para esta ou aquela deficiência e/ou dificuldade de aprender. Os alunos aprendem nos seus limites e se o ensino for, de fato, de boa qualidade, o professor levará em conta esses limites e explorará convenientemente as possibilidades de cada um.

O professor, além de seu profissionalismo, precisa ter capacitação e estar disposto a trabalhar o desenvolvimento do aluno com necessidades educativas especiais. É preciso que ele tenha um excelente relacionamento interpessoal com todos os alunos, baseado no diálogo, no respeito e no afeto, uma vez

A escola, como espaço principal de manifestação da diversidade, necessita repensar e defender uma escolarização que tenha como princípio uma prática inclusiva efetiva.

 

 

Referências Bibliográficas

 

COLL, Cesar; MARCHESI, Álvaro; PALÁCIOS, Jesús. Desenvolvimento psicológico e educação. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2004, v. 3.

LAJONQUIÈRE, Leandro de. Para repensar as aprendizagens: de Piaget a Freud – a

psicopedagogia entre o conhecimento e o saber. 7. ed. Petrópolis: Vozes, 1998.

LA TAILLE, Yves de. Piaget, Vygotsky, Wallon: teorias psicogenéticas em discussão. São Paulo: Summus Editorial, 1992.

LÓPEZ, Felix. Problemas afetivos e de conduta na sala de aula. In: COOL, C. PALÁCIOS, J.

MAHONEY, A. A.; ALMEIDA, L. (org.) Afetividade e aprendizagem: contribuições de Henri Wallon. São Paulo: Edições Loyola, 2007.

Wallon. São Paulo: Edições Loyola, 2007.

______. (org.) Henri Wallon: psicologia e educação. São Paulo: Loyola, 2000. MANTOAN, Maria Teresa Eglér. O desafio das diferenças nas escolas. Petrópolis, RJ:

Vozes, 2008.

 

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